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Correio da Educação

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1. Parece estar a esgotar-se a reserva humana do interior do país que desde sempre alimentou destinos migratórios que contribuiram para consagrar a secular diáspora portuguesa. De origem judaica, com um matiz punitivo, por o “povo eleito” “não obedecer aos preceitos divinos”, a diáspora é um “fenómeno particularmente estável, ao contrário […] da emigração que no uso actual é dinâmico” (GEPB).

Assim, o termo diáspora atribui-se às comunidades de um dado país espalhadas pelo mundo, no seu conjunto. O de emigração corresponde à saída voluntária para outro país e por extensão, para as colónias do próprio. Implica a deslocação voluntária ou um acto espontâneo, o estabelecimento numa outra cultura através de um processo de inserção o que se diferencia do afastamento do viajante ou mercador.

 

2. À luz destes conceitos, como caracterizar o afastamento do corpo de funcionários embaixadores de países fora destes, desde sempre, e, modernamente, a busca de personalidades, por parte de instituições de países, mais desenvolvidos, dos mais diferentes campos, da economia à ciência, da saúde ao cinema, das artes ao futebol?

Esta terceira e nova realidade, tem como singularidade a sua cobertura institucional no motivo da deslocação. Ou seja, mais do que o carácter espontâneo ou individual da decisão de partir, encontra-se a busca e vontade de quem recebe, suportada numa necessidade, a preencher por traços idiossincráticos de quem se desloca.

Seriam os casos das deslocações, na economia e na política, em breve, de Vitor Constâncio, de Lisboa, onde é Governador do Banco de Portugal, para Bruxelas, onde será Vice-Presidente do Banco Central Europeu, e de JoãoVale de Almeida, de director de Relações Públicas da Comissão Europeia e de ex-chefe de gabinete de Durão Barroso, para embaixador da União Europeia em Washington.

Em tal categoria, poderiam ser incluídas pessoas que, umas mais do que outras, começam a alcandorar-se a personalidades de relevo mundial como José Mourinho, Luís Figo e Cristiano Ronaldo, no futebol. Mas, também, António Damásio na saúde, Joaquim Almeida, no cinema ou Horta Osório, na Banca.

 

3. Pequenina, mas por isso mais humana e pessoal, como “o rio que corre pela minha aldeia”, de Alberto Caeiro / Fernando Pessoa, fica a realidade, porventura generalizável, da emigração e diáspora de uma família média portuguesa.

Foi a saída do avô, nos anos 20 do século passado para o Brasil ou Argentina, estabelecendo-se na agricultura ou no comércio. Do pai, nos anos 60 para a Europa, nomeadamente a França, por vezes, a salto, aparentemente, contra a vontade das autoridades, trabalhando em fábricas e na construção civil. Do dele próprio, emigrante na Suíça, Inglaterra ou outro país europeu, nos anos 80, fixando-se na restauração e no comércio; e, regressado, do filho, agora técnico, formado na escola portuguesa que se vai, na era da globalização, para todo o lado onde há necessidade dele, da China à Suécia, dos Estados Unidos ao Brasil, de Espanha a Inglaterra ou Alemanha.

Na primeira globalização, nos séculos XV e XVI, tivemos um papel determinante, como técnicos dominadores da navegação e da comunicação com os indígenas dos quatro cantos do mundo. Saído de Sabrosa e formado nas lides do mar, foi como técnico, pensando-se subaproveitado pelo rei português, que Fernão Magalhães dá a volta ao mundo ao serviço de uma potência estrangeira.

Na segunda globalização, muitos portugueses já se encontram na linha da frente para desempenharem as funções técnicas que na sua terra aprenderam, mas onde, de novo, se sentem com capacidades superiores àquelas de que a sua comunidade deles necessita.

Oxalá tenham oportunidade de aplicar os talentos e as energias com satisfação e proveito pessoais, com retorno para a comunidade que neles investiu e com obra louvável no local escolhido para trabalharem. Coube-lhes hoje o nosso destino, cantado em verso pelo poeta, de terem “a vida / Pelo mundo em pedaços repartida”. (Camões, “Canção IX”).

 

 

 

J. Esteves Rei - Professor Catedrático de Didáctica das Línguas e de Comunicação, na UTAD, Vila Real

 

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