A hora dos alunos…
1. Um braço-de-ferro nunca é uma boa atitude na resolução de um problema, mas foi aquilo a que assistimos entre o Ministério da Educação e os Sindicatos dos Professores, durante os últimos quatro anos. “Já tínhamos saudades de uma negociação assim…” – Exclamava o secretário da Fenprof após o acordo.
A verdade é que essa luta tomou o país inteiro, pelo facto de todo o cidadão ter uma relação qualquer com o problema, profissional, familiar, cívica ou, simplesmente, intelectual, para tentar compreender.
2. Durante séculos, a educação foi uma questão de família, iniciada pela escolha de um pedagogo / preceptor para a(s) criança(s), por parte das que o podiam ter. Embora na Grécia fosse uma questão pública ou política (<= da polis ou Cidade / Estado), em Roma foi uma questão familiar, até o Império criar exigências que levaram ao surgimento da escola romana.
Em Portugal, as primeiras escolas nascem à sobra das catedrais, na Idade Média, e os primeiros colégios, no Renascimento, sob a coordenação dos padres jesuítas, como aconteceu pela Europa. Com o Marquês de Pombal surge a Aula de Retórica em cada comarca e, assim, nasce o professor, funcionário régio. Inicia-se a relação “laboral” que crescendo deu braço-de-ferro, quebrado há dias.
Ao lado desta história, a do sistema educativo, há outra história com outros actores, cuja visibilidade depende do tempo e do espaço: a dos alunos. Sem eles, não há sistema educativo, não há escola e, no limite, não haveria sociedade, civilização, futuro. E é estranho que, nos últimos anos, os alunos tenham andado tão arredio quando se fala (de problemas) da educação. É que eles são o centro desta, ao longo de milénios.
Desde Isócrates, Séneca e Plutarco que se encontram definidos os objectivos, as actividades e os métodos – realidades tão esquecidas ultimamente – a que deve obedecer a educação. Não perderam pertinência nem actualidade apesar das mudanças sociais ocorridas no tempo. Assim, há que regressar ao passado, que será o futuro, pois o presente… é para ultrapassar!
O ideal educativo, temo-lo delineado desde Isócrates, por este legado no século IV:
i) o corpo e o espírito são os elementos constitutivos do ser humano, a cuidar pela educação (“Isocrate, Sur l’Échange”, in Extraits des Orateus Attiques, par L. Bodin, Paris, Hachette, 1984:109);
ii) é indispensável ter em conta “as disposições naturais” (113) de cada um e “a exercitação prática”, a partir dos conhecimentos das “ciências / disciplinas” (118);
iii) o objectivo é “formar o espírito” (115) e “preparar o corpo para o esforço” (110), “a robustez e a resistência físicas” (111);
iv) os métodos ainda não foram suplantados: “ser minimamente dotado para aquilo a que o jovem se destina, receber educação e adquirir a ciência conveniente para a carreira, treinar-se no manejo e na prática dessa carreira – assim se acede à perfeição e à superioridade sobre [si próprio e] os outros” (111);
v) o pressuposto da educação é que “as crianças, quando se esforçam numa aprendizagem teórica ou prática, tornam-se mais capazes de assimilar outros conhecimentos relevantes e sérios na sociedade” (118);
vi) como conselho aos jovens, Isócrates afirmava que: “dediquem uma parte do seu tempo a estudos deste género, mas não deixem esmorecer o seu espírito nem se deixem ir atrás das elucubrações dos velhos sofistas” (118).
3. Falta apenas, aqui e agora, dar cumprimento ao percurso milenarmente válido e que tem proporcionado tão bons resultados, a menos que lhe descubram alternativa mais coerente e adequada ao nosso tempo.
Não acredito naquilo que, nos últimos anos, vários cidadãos chegam a verbalizar, terem a impressão de haver professores que viveriam bem sem alunos. Uma coisa é certa, porém, estes têm de ocupar o centro das preocupações relativas à educação: por parte de Ministério e professores, universidades e Escolas de formação, pais, políticos e sociedade, em geral.
J. Esteves Rei - Professor Catedrático de Didáctica das Línguas e de Comunicação, na UTAD, Vila Real.