- Que fizeste hoje na casa das tabuinhas [a escola], meu filho? – Perguntava o mercador fenício, de regresso a casa, após os negócios, em longínquas paragens. E pela resposta, media os ensinamentos do Mestre na formação do futuro mercador.
Na Sicília, depois da deslocação de grandes massas de populações, ao regressarem ao local de origem, cada cidadão devia provar, perante a nova autoridade, que dado pedaço de terra lhe pertencia. Para isso, tinha apenas o discurso retórico, persuasivo e convincente. Então, os mais eficientes na argumentação, tornados mestres, iniciavam os menos dotados na aprendizagem do sucesso discursivo. Assim nasceu a escola.
Em Roma, César Augusto sentiu necessidade de uma educação pública que fosse o cimento da manutenção do império, por oposição à educação do “pater famílias”. E uma plêiade de homens superiores – Ovídio, Tácito, Horácio e Virgílio – reunidos em casa de Mecenas, produziram os textos que deram origem à escola romana.
Outros povos, validaram a aprendizagem da vida, complementando-a com a educação formal do Mestre-Escola.
Hoje, porém, muitos perguntam: - Por onde anda essa escola que ainda foi conhecida de tantos, escolarizados e formados nos anos cinquenta e sessenta do século passado? Respondem alguns: - Talvez se encontrem vestígios dela em escolas profissionais, talvez nalguns colégios privados, talvez numa ou noutra escola pública…
Para que serve hoje a escola? Qual a sua missão? Que metas, uma vez alcançadas, materializam o sucesso humano, educativo, social, profissional da escola? E qual é o novo lugar do professor nela?
A dúvida já tomou o próprio aluno sobre o valor das duas aprendizagens, a da vida e a da escola, que pergunta angustiado, perante a divergência dos seus familiares:
“Trago a fisga no bolso detrás / E na pasta o caderno dos deveres. / Mestre-Escola, eu sei lá se sou capaz / De escolher o melhor dos dois saberes // Meu pai diz que o Sol é que nos faz; / Minha mãe manda-me ler a lição / Mestre-Escola, eu sei lá se sou capaz, / Faz-me falta ouvir outra opinião.” (A Fisga - Rio Grande)
É que, por um lado, o saber é cada vez mais frágil e os conteúdos, a introduzir nos currículos, são cada vez mais dispersos e em maior quantidade. Por outro, é crescente a desmotivação de jovens e adultos, alunos e professores perante esses conteúdos. Por último, não há brio pela escola – lugar, instituição, modo de ser, estar ou fazer – nem há um projeto mobilizador de alunos, pais e professores.
Mas, um dia, a estima pela escola voltará e o professor responderá ao aluno da Cecília Meireles, acompanhando-o no seu crescimento, com apoio e consideração dos pais:
Professor, diz-me porquê? / Por que voa o papagaio? […] / Por que roda o meu pião? […] / Por que é que o céu é azul? / Por que é que marulha o mar? / Porquê? / Tanto porquê que eu queria saber! / E tu que não me queres responder! / Tu falas falas professor / […] Eu sou uma criança / […] Mas penso / […] E quando tu depois vens definir / o que são conjunções / e preposições… / quando me fazes repetir / que os corações / têm duas aurículas e dois ventrículos / […] o meu coração que não sei como é feito / […] quer saltar cá para fora / professor / a ver se tu assim compreenderias / e me farias / mais belos os dias.” (Cecília Meireles).
Quando e como acontecerá? Ao apontarmos os valores, a reintroduzir na escola e a colocar perante os seus agentes. Ao decidirmos investir nela: dos edifícios à organização dos espaços, do atendimento às Relações Públicas, da apresentação pessoal às novas tecnologias.
Ao descobrirmos os novos conteúdos, próximos da sociedade do futuro, a dos jovens e a dos adultos. Então, a escola deixará de ir atrás da sociedade, antes, a influenciará no que ela deverá ser no futuro.
J. Esteves Rei - Professor Catedrático de Didáctica das Línguas e de Comunicação, na UTAD, Vila Real